A relação entre terapia de reposição hormonal (TRH) e o câncer de mama é um dos temas que mais gera insegurança entre mulheres que entram na menopausa.
Esse receio, no entanto, não surge apenas da evidência científica, mas também da forma como informações complexas foram difundidas ao longo dos anos, muitas vezes sem o contexto necessário.
Durante décadas, a TRH foi prescrita de forma ampla, sem a individualização que hoje faz parte da prática médica. Quando estudos começaram a apontar riscos em determinados grupos, a interpretação generalizada foi de que “hormônio causa câncer”, uma simplificação que não reflete a realidade clínica atual.
A origem da associação entre TRH e câncer de mama
Fazendo um breve resumo, grande parte do medo em torno da TRH vem dos resultados iniciais do estudo Women’s Health Initiative (WHI), publicado no início dos anos 2000. Esse estudo avaliou mulheres com idade média acima de 60 anos, muitas delas com sobrepeso, doenças metabólicas e vários anos de menopausa, utilizando formulações hormonais específicas, hoje pouco usadas.
Hoje se sabe que os resultados não podem ser automaticamente extrapolados para mulheres mais jovens, no início da menopausa, utilizando esquemas hormonais modernos e individualizados.
O que os dados mais recentes mostram
Estudos posteriores e reanálises do próprio WHI indicam que o risco de câncer de mama associado à TRH é dependente de diversos fatores: tipo de hormônio utilizado, dose, via de administração, tempo de uso e perfil de risco individual da paciente.
Em muitas situações, o aumento absoluto de risco é pequeno e comparável a fatores comuns do cotidiano, como consumo regular de álcool, sedentarismo ou obesidade — riscos que raramente geram o mesmo nível de medo.
Estrogênio isolado e terapia combinada
Mulheres que fizeram histerectomia e utilizam estrogênio isolado apresentam um perfil de risco diferente daquelas que usam estrogênio associado à progesterona. Alguns estudos, inclusive, mostram que o estrogênio isolado não aumenta — e pode até reduzir — o risco de câncer de mama em determinados contextos.
Já as terapias combinadas exigem uma avaliação mais cuidadosa, especialmente em relação ao tempo de uso e ao tipo de progesterona empregada.
A importância da via de administração
A via transdérmica (adesivos ou gel) tende a ter um impacto metabólico diferente da via oral, com menor efeito sobre fatores inflamatórios e trombóticos. Esse detalhe técnico é fundamental na prática clínica moderna, mas raramente aparece em discussões superficiais sobre o tema.
Mais uma vez, generalizações não ajudam a tomada de decisão.
Benefícios que precisam entrar na conta
Ondas de calor intensas, distúrbios do sono, alterações de humor, perda de massa óssea e impacto negativo na qualidade de vida são sintomas reais, com consequências clínicas relevantes. Para muitas mulheres, a TRH oferece alívio significativo e melhora funcional mensurável.
Ignorar esses benefícios em nome de um medo genérico também pode gerar prejuízo à saúde.
Mulheres sintomáticas, especialmente nos primeiros 5 a 10 anos após a menopausa, sem contraindicações formais, podem se beneficiar da terapia quando bem indicada e acompanhada. Histórico familiar, densidade mamária, exames de imagem e perfil metabólico fazem parte dessa decisão.
TRH não é tratamento padrão para todas, mas também não deve ser descartada sem análise individual.
O risco real não está em discutir a TRH, mas em decidir com base em desinformação. Quando a mulher entende riscos, benefícios e alternativas, a escolha deixa de ser guiada pelo medo e passa a ser uma decisão consciente e alinhada à sua saúde global.
